sexta-feira, 7 de julho de 2017

Craques na Sombra (1)

O "Com Pés e Cabeça" tem o prazer de anunciar a criação de uma nova rubrica: Craques na Sombra. Em linhas gerais, esta iniciativa procura referenciar positivamente, em jeito de homenagem, jogadores de inegável qualidade que, pelas circunstâncias mais diversas – a maior parte delas fora do seu controlo – acabaram por ter carreiras afastadas dos grandes palcos. Fundamentalmente, acredita-se que um jogador de futebol não é o que é, pura e simplesmente, e que o contexto envolvente assume muitas vezes um papel decisivo no seu sucesso ou insucesso: sim, a linha que separa um percurso genial de um percurso normal é mais ténue do que se possa pensar…
Antes de mais, devo confessar que, até há relativamente pouco tempo, não conhecia o jogador que merece a honra de protagonizar a primeira edição desta rubrica; chamou-me à atenção pela primeira vez no início da época que agora findou, ao serviço de uma das equipas revelação da liga espanhola, e desde então tenho procurado acompanhá-lo com atenção redobrada.
Pequeno, franzino, com um bigodinho a adornar-lhe o lábio superior e cabelo esticado para trás com gel, é difícil não sentir, ao vê-lo dominar a zona da meia-lua com aparente facilidade, uma certa nostalgia daqueles "jogadores à moda antiga" que preenchiam o nosso imaginário do futebol de antigamente; não o vi jogar, mas gosto de acreditar que, por exemplo, Luis Suárez, o lendário médio do Barcelona e do Inter conhecido como El Arquitecto, teria um carisma, uma aura e uma personalidade semelhantes.
O seu futebol, no entanto, não tem nada de antigo ou de ultrapassado, bem pelo contrário. Podia falar dos excelentes atributos defensivos – da forma como lê e antecipa os lances, da colocação dos apoios, do tempo de desarme, da agilidade – ou mesmo do estilo brigão que faz as delícias dos adeptos, mas são meros fait-divers quando comparados com o que verdadeiramente faz dele um jogador diferente, que é o que faz com a bola nos pés. Dono de um sentido posicional invejável, o que lhe permite acompanhar as jogadas de perto e ser um primeiro apoio para tirar a bola da pressão, é mentalmente muito forte e gosta de ter a bola nos pés e de pautar os ritmos de jogo da equipa. É daqueles médios em quem os colegas confiam, entregando-lhe a bola mesmo estando rodeado de adversários, porque sabem que não a vai perder. Recebe, rodopia no meio da molhada e solta. Isto é, solta se isso for a melhor opção, senão fica com a bola. E se assim for, depois não há ninguém que lha tire! O critério das suas decisões é notável e a exploração dos apoios verticais para quebrar linhas adversárias, colocando a bola nas costas da pressão, do melhor que há por aí.
Aliás, embora jogue mais recuado, como médio defensivo, o seu futebol, que basicamente consiste em tomar a melhor decisão possível a cada momento, faz-me lembrar, em larga medida, Xavi Hernández. A propósito do médio do Barcelona, há quem seja da opinião de que Xavi chegou onde chegou e teve a carreira que teve porque tinha qualidades que mais ninguém tinha. Discordo completamente disto. Não porque não reconheça a Xavi uma categoria absolutamente fora do comum, mas porque médios com a sua inteligência, criatividade, classe, qualidade de passe e finura técnica sempre existiram na história do jogo. Sempre. Xavi é extraordinário, mas não é único. Simplesmente teve a felicidade de estar no sítio certo e na altura certa quando Pep Guardiola assumiu o comando do Barcelona em 2008, o que permitiu dar ao seu jogo um sentido e uma dimensão que não tinha até então, mas estou plenamente convencido de que muitos excelentes jogadores de quem hoje pouco ou nada se fala, se tivessem podido jogar naquela que foi, para mim, a melhor equipa de sempre, teriam atingido um nível e um reconhecimento idênticos ao de Xavi. É, na minha opinião, o caso do jogador de que falo. E também de Iván de la Peña, de Juan Carlos Valerón e de tantos outros, mas isso fica para outro texto…
Os mais atentos já terão adivinhado de quem falo, mas agora que abandonou o futebol espanhol para, aos 28 anos, abraçar um novo desafio na mais mediática Premier League, parece-me a altura apropriada para destacar o pequeno grande jogador que é…Roque Mesa.

Sem comentários: