terça-feira, 29 de dezembro de 2015

Progredir, passo a passo

Dentro da realidade do treino existem várias vertentes passíveis de serem moldadas para se adaptarem às mais diversas intenções. A complexidade crescente e consequente progressão de determinado exercício é das mais interessantes pelos benefícios que delas podem advir.

Certo dia, na companhia de um dos colaboradores deste blog, alguém com quem trabalhávamos disse: "Nunca repitam o mesmo exercício. Todos os dias, quero novos exercícios." A afirmação deixou-nos apreensivos. Como é que poderíamos trabalhar um determinado estilo de jogo e criar uma identidade dentro da nossa equipa sem repetir exercícios? Aceitando que a repetição sistemática para além do "sumo" que certo exercício pode oferecer é prejudicial, essa repetição, quando bem doseada e dentro de um limite que favoreça um binómio de dificuldade\progressão, é fundamental. Seja na formação de uma ideia de jogo dentro da própria equipa, seja na interiorização de conceitos que, sem ela, se perderiam num curto espaço de tempo.

Contudo, é aprazível refletir sobre o tema. Apesar de não concordar com a peremptoriedade da afirmação, são compreensíveis as suas origens. Estímulos diferentes provocam novas situações que permitem a criação de novas soluções. E se queremos formar jogadores que se adaptem conforme o desenrolar o jogo, essa variabilidade é algo que não podemos descurar. Mesmo assim, pensando em estruturas iguais é possível obter resultados distintos, isto porque os incentivos necessários para evoluir baseiam-se, também, na progressão de conceitos de forma gradual e constante. E neste sentido é possível enquadrar exercícios de estruturas iguais e suas devidas progressões (um bom exercício em Novembro pode já não o ser em Fevereiro e o inverso também pode ser verdadeiro, porque tudo depende do momento da equipa e da sua adaptação perante as ideias que se tentam adquirir).

Seguindo esse raciocínio, o mesmo exercício-base, com ajustes graduais (progressão), permite a continuação de uma implantação coerente de ideias, variando os estímulos e conferindo ao mesmo tempo uma dificuldade ajustada ao momento e compreensão da equipa (complexidade). Ao contrário de tentar criar constantemente novos exercícios, interessa sim moldar os que se tenham provado eficazes, que respeitem e estimulem as ideias pretendidas, de acordo com o estado de complexidade que determinada equipa consegue resolver. Seja através da redução do espaço de execução, de novas regras que dificultem a obtenção dos objetivos, ou apenas objetivos diferentes mas mais exigentes. A validade de um exercício terá sempre que ser analisada por aquilo que objetivamente obtém, diariamente, e não por idealizações pré-concebidas.

Dentro deste pensamento importa também considerar a compreensão e o à-vontade do jogador. Estar constantemente a introduzir novos exercícios torna-se desconfortável e ineficaz pelo período de adaptação que tem necessariamente de existir até haver uma confiança e naturalidade perante os mesmos. Daí que para o contrariar é preciso inovar dentro de situações conhecidas e só dar o próximo passo (novos exercícios) quando realmente for necessário. Mudar por mudar nunca foi nem nunca será boa política.

Uma tangente com fulcral importância no tema poderia aqui também ser referida (a necessidade de exercícios com resoluções "abertas"), mas ficará para outro dia. Importa ter a ideia de que se a repetição é fundamental na aquisição, a evolução que se pretende terá obrigatoriamente que lhe ser associada. Evitar sobrecarregar os jogadores com situações e problemas desnecessáriaos. O caminho para o conseguir está no espaço que podemos e devemos conceder à mutação da nossa operacionalização. Sempre numa progressão constante, não necessariamente linear mas devidamente sustentada.

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